Por que é mais fácil combater notícias falsas em pequenas cidades

Carlos Castilho
3 min readMay 4, 2019

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As chamadas fake news (notícias falsas) já foram incorporadas ao vocabulário político nacional e internacional como um item corriqueiro. Mas sua influência nas relações entre governos locais e as respectivas comunidades ainda é um tema inexplorado, mesmo tendo um peso relevante nas decisões municipais e regionais.

Imagem Pixabay / Creative Commons

A importância das notícias falsas no dia a dia das pequenas e médias cidades é muito maior do que no âmbito nacional e internacional porque as comunidades locais, como regra geral, têm muito menos acesso à informação sobre quase todos os temas que afetam seu cotidiano.

A exclusão informativa no contexto municipal acaba gerando dois outros fenômenos: a formação de bolhas informativas baseadas em notícias falsas e a proliferação de boatos e rumores, alimentados pela incapacidade das pessoas fazerem um juízo crítico sobre o que estão lendo, vendo ou ouvindo.

A conjuntura criada pelo avanço da digitalização nos processos de comunicação disponibiliza para as comunidades locais um arsenal inédito de ferramentas digitais. No entanto, estes recursos acabam não sendo usados em benefício público por falta daquilo que os pesquisadores universitários definiram como “alfabetização informativa”, ou seja, conhecimentos sobre o que é a informação digital, como usá-la e como neutralizar consequências negativas, como a proliferação de notícias falsas.

A nova realidade digital aumentou a importância das comunidades locais , que se tornaram nichos econômicos atraentes para os investidores globalizados graças às novas tecnologias de comunicação e informação, bem como passaram a ser um refúgio, cada vez mais procurado, por indivíduos desiludidos com a vida nas grandes cidades, especialmente as pessoas com mais idade e mais experiência.

Isto acaba criando tensões entre os nativos locais e os novos moradores por conta do desnível informativo entre ambos. Os jornais locais poderiam contribuir para o entendimento mútuo, mas seu papel é praticamente nulo nesta questão devido à crise do modelo de negócios da imprensa e dos compromissos assumidos com as elites políticas tradicionais.

“Alfabetização informativa”

A ausência de políticas de inclusão informativa e de valorização das comunidades como fator de produção de conhecimentos locais cria um ambiente favorável à disseminação de notícias falsas, boatos e rumores. O antídoto para este processo é a “alfabetização informativa”, um sistema de aprendizagem dos sistemas digitais e que inclui projetos de publicações alternativas para dar às comunidades elementos para que elas consigam identificar boatos, rumores e notícias falsas.

O fato das pessoas, numa cidade pequena, terem muito mais contato direto entre si e com os seus governantes, facilita enormemente a checagem de notícias, o que é muito mais difícil nas grandes cidades e metrópoles nacionais. Cidadãos minimamente “alfabetizados informativamente” , além de poderem criar bases mais sólidas para o exercício da democracia local, podem também ter uma participação direta na produção de notícias de interesse coletivo, como foi demonstrado recentemente num experimento feito na Escola Walter Cronkite de Jornalismo, na Universidade Estadual do Arizona, nos Estados Unidos.

Ainda nos Estados Unidos dois projetos de checagem de notícias desenvolvidos em Nevada e Wisconsin por jornalistas independentes, se transformaram em modelos nacionais de sucesso, ao envolverem pessoas de todos os níveis sociais no esforço para combater as fake news. O Indy Fact Check, no estado de Nevada, e o Reality Check, em Madison, no estado de Wisconsin, focam nos temas locais e a colaboração do público foi fundamental para o esclarecimento de dúvidas na credibilidade de notícias regionais.

O projeto Coda Story, uma organização binacional com escritórios na Geórgia (uma ex-república soviética) e nos Estados Unidos, admite que os esforços locais para identificar notícias falsas são mais bem sucedidos quando envolvem os moradores de uma pequena cidade na investigação direta dos fatos sob suspeita. Quando as pessoas dispõem de canais para expressar seu conhecimento de fatos, como sites de checagem de notícias, a informação flui mais rapidamente permitindo um rápido esclarecimento das dúvidas e suspeitas.

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Carlos Castilho
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Written by Carlos Castilho

Jornalista, pesquisador em jornalismo comunitário e professor. Brazilian journalist, post doctoral researcher, teacher and media critic

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