Estamos mergulhando numa turbulência informativa
Já está claro que estamos entrando num período de turbulência noticiosa gerada pela intensificação da batalha política entre duas visões de mundo. E neste ambiente cresce a importância do que é conhecido como alfabetização informativa, ou seja, os conhecimentos necessários para identificar o que não está evidente na publicação de uma notícia jornalística.
O termo turbulência informativa expressa a intensificação das diferenças entre versões e contraversões, a o enviesamento de notícias, a descontextualização de dados e fatos, a ocultação de interesses políticos ou econômicos, omissões deliberadas, fake news, meias verdades e várias outras armadilhas que compõem o que conhecemos como desinformação.
É um quadro supercomplexo que está transformando a leitura de jornais, visita a redes sociais ou a sintonização de telejornais numa espécie de aventura em campo minado. A velha tranquilidade de confiar no que sai publicado na imprensa ou na TV está sendo substituída por uma desconfortável sensação de insegurança e incerteza já que fica cada vez mais difícil saber se estamos sendo enganados ou não, que fala a verdade ou não, quais os interesses ocultos atrás de cada notícia.
É uma nova realidade surgia a partir da avalancha noticiosa na internet onde a diversificação de fontes informativas e a intensidade dos fluxos de notícias estão levando ao limite a nossa capacidade de desenvolver conhecimentos a partir de novos dados, fatos e eventos publicados nos veículos de comunicação.
Podemos lidar com este verdadeiro massacre informativo de duas maneiras: simplesmente ignorando-o ou tentando entendê-lo. A primeira opção é a mais fácil e tranquila, mas equivale a enterrar a cabeça na areia, como fazem as emas quando não sabem o que fazer. A outra possibilidade exige esforço, tempo, estudo e perseverança. Não é nada fácil, mas é a que nos permitirá mínimas condições para sobreviver no mundo em que vivemos.
É o que se convencionou chamar de alfabetização informativa, o conjunto de conhecimentos que nos permitirá identificar o DNA de uma notícia jornalística e com isto nos ajudar a tomar as decisões que atendam aos nossos desejos, necessidades e preocupações. Só que esta alfabetização informativa, conhecida nos meios acadêmicos como literacia (1), é algo que precisa ser aprendido como se fosse um tema escolar. Nós já havíamos desenvolvido intuitivamente alguma capacidade de distinguir o certo do errado, mas as novas tecnologias digitais aumentaram extraordinariamente a complexidade do nosso ecossistema informativo (2).
A imprensa e a literacia
A alfabetização informativa na era digital é um processo que envolve automatizar a preocupação com a identificação, localização, avaliação, aplicação e checagem das fontes nas notícias lidas, ouvidas ou vistas por nós. É claro que isto não acontece da noite para o dia, mas é uma necessidade nova que nos tira da zona de conforto a que estamos habituados quando assistimos televisão, acessamos uma rede social ou visitamos um site de notícias. A literacia informativa é a ferramenta mais eficiente, surgida até agora, para combater a massificação das notícias falsas, que em períodos tensos como os que estamos vivendo agora no Brasil, podem nos induzir a erros graves na percepção da nossa realidade política, social e econômica.
A imprensa deveria ser uma interessada direta no enfrentamento da turbulência informativa, mas o que observamos atualmente é a contaminação, deliberada ou não, de grandes jornais pelo vírus do enviesamento de notícias, especialmente as relacionadas à mudança de governo no âmbito federal. É uma postura que pode deflagrar processo imprevisíveis, especialmente num contexto em que a polarização ideológica tende a se agravar no país. A imprensa e o jornalismo precisam se dar conta que passaram a lidar com uma matéria prima altamente inflamável e potencialmente letal, como a notícia.
(1) Literacia, capacidade de interpretar uma noticia, é um anglicismo inspirado na expressão literacy , grau de instrução. O termo abrangia inicialmente apenas questões escolares, mas agora é cada vez mais usado na comunicação e no jornalismo. O acento tônico está na última silaba.
(2) Ecossistema informativo é o conjunto de elementos geográficos, políticos, econômicos, étnicos e culturais que condicionam a forma como uma pessoa se informa.